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nesses últimos dias em São Paulo, tenho tido muito tempo pra ficar com pessoas queridas, mas também tenho curtido alguns momentos comigo mesma. e esses momentos sempre rendem sessões de autoterapia.

é engraçado perceber que, por um período, parece que me esqueci de quem realmente sou. vim sozinha para essa cidade enorme, trabalhei exaustiva e loucamente enquanto tentava aproveitar tudo o que uma metrópole oferece de bom. só que acabei menosprezando uma questão fundamental: por quê?

sinceramente não sei responder. quis, sim — senão não teria feito. mas analisando de uma forma mais distante, a impressão que tenho é que, de repente, entrou tudo no automático, como quando a gente pega um folheto, fica com dó de jogar fora e deixa ele ali. e foi assim que me perdi no meio de montes de coisas desorganizadas.

enquanto arrumo tudo materialmente e avalio o que deve ser guardado, aproveito pra perceber o que realmente me faz bem, me deixa feliz e me faz sentir completa. e, definitivamente, o mais valioso são os amigos que conquistamos. e as experiências que tivemos com eles.

nesse momento de separar o que fica e o que vai para o lixo, tenho notado como fui deixada de lado por pessoas que eram muito queridas por mim. essa parte é muito difícil, mas o que compensa é perceber o quanto algumas outras reservam uma caixa bem bonita num espaço privilegiado pra me guardar. gente que se importa e faz questão de estar presente mesmo quando não dá para estar ali do lado.

o desapego tem sido uma grande lição dos últimos tempos. o desafio, pra mim, é aprender a viver bem com o necessário e deixar para trás tudo o que só ocupa espaço, sem dor no coração ou peso na consciência. assim como nas companhias aéreas, a gente na vida não pode ter excesso de bagagem e, por isso, é importante escolher com critério o que queremos (ou conseguimos) carregar e aprender a prestar atenção no que colocamos na mochila, antes de começar a acumular de novo.

não vou dizer que não é estranho entrar no quarto e vê-lo quase vazio. incomoda notar que algumas coisas não estão mais onde sempre estiveram, ou então perceber que há apenas um espaço onde antes tinha um montinho de papéis. faz falta, é verdade, mas uma hora ou outra eu teria de descartá-los — ou encontrar um significado (e não uma desculpa) que os tornasse úteis.

pode parecer uma questão de acerto de contas, mas não tem nada a ver com isso. tem a ver com definir prioridades: não vou gastar meu tempo pensando em porquê alguém simplesmente desapareceu, vou aproveitar esse tempo para estar com quem realmente quer estar comigo ou escrever uma carta pra quem às vezes some mas está lá sempre que é necessário.

enxergando assim até parece simples, colocar em prática é que são elas. acredito, entretanto, que é uma questão de hábito, mais ou menos como em vez de carregar mais um folheto inútil, preferir guardar a fotografia de um bom momento.

um país estranho, um idioma desconhecido, cultura e clima diferentes. praticamente um novo mundo, um grande desafio.

sair da zona de conforto, por si só, me coloca “na berlinda”. além disso, foi preciso reunir uma dose reforçada de coragem e bastante desprendimento para arriscar. mas por que não?

o destino escolhido é a linda Berlim. uma metrópole que fica no centro da Europa e onde o antigo e o contemporâneo convivem diariamente. ou seja, a oportunidade de viver a história e ao mesmo tempo experimentar as tendências de perto.

um tempo pra mim, a realização de um sonho, o retorno aos estudos, uma aventura que fica mais próxima a cada dia. um momento egoísta, sim. mas por que não? 😉

os dias passam e tenho cada vez mais a impressão de que as coisas vão ficando para trás. por mais que eu tente não encarar dessa forma, sempre que vou a algum lugar penso se será a última vez antes de viajar. e aí bate aquela necessidade de reforçar as fotos mentais do post anterior.

além de cuidar dos preparativos, tenho aproveitado os momentos para estar com pessoas queridas e recarregar o estoque de lembranças. apesar de saber que verei novamente antes de embarcar a maioria dos amigos, o engraçado é que após os encontros retomo a minha rotina mas fico recuperando recordações mais antigas. como se estivesse passando-as a limpo para que possam ser relidas quando a saudade aparecer.

me dei conta que, mais uma vez inconscientemente, tenho promovido “pequenas despedidas” já há alguns meses, mesmo quando as coisas ainda estavam incertas. espero aprender a técnica direitinho e praticá-la mais frequentemente, sem a desculpa da viagem.

a ficha está começando a cair pra valer. antes estava tudo muito distante, era sóóó em setembro, muita coisa ainda na esfera dos planos e/ou sonhos. agora já é no mês que vem, está quase tudo pronto! parece que a cada dia a viagem e a mudança ficam mais reais, tomam forma. e a vontade é aproveitar cada segundinho dessa ansiedade gostosa.

hoje comprei as minhas fiéis escudeiras — acabei de batizá-las de Dom Quixote e Sancho Pança: as malas. uma é vermelha e tão grande que acho que, em caso de emergência, consigo até me abrigar dentro dela. a outra é, na verdade, uma mochila com rodinhas e que deve me acompanhar mais frequentemente, nas “mochiladas” que pretendo dar enquanto estiver no velho mundo. — preciso aproveitar, né?

já comecei a colocar algumas roupas dentro e vieram os devaneios. há muita coisa pra levar, sim. mas para carregar a maioria não preciso de malas nem de rodinhas. nos últimos dias, tenho andado mais atenta pela cidade — notei isso quando me vi admirando a placa com o nome da “minha” rua em São Paulo enquanto os outros pedestres a atravessavam apressados. no fim de semana, enquanto descia pelo mesmo caminho de sempre, reparei que trocaram o tampão de um duto de gás na calçada. justo eu, que de tão distraída não percebo um conhecido passando por mim em qualquer esquina!

tenho a impressão de que, inconscientemente, venho tentando reforçar as minhas fotografias mentais para que elas durem mais tempo na memória. (e o meu maior medo sempre foi esquecer!)

para não correr o risco delas desaparecerem enquanto estiver longe, vou aproveitar conscientemente os próximos dias e colocar minhas Lomos para trabalhar. além de casacos, sapatos e remédios, vou levar algumas fotos físicas (ou digitais, mais provavelmente).

e espero que meus Dom Quixote e Sancho Pança sejam suficientes também para trazer toda a bagagem que pretendo acumular por lá.